Eu tinha seis anos de idade quando vi uma baleia orca de perto pela primeira – e última vez.
Foi durante o “Orca Show”, uma das mais famosas atrações do Playcenter – extinto parque de diversões da cidade de São Paulo.
À época, ao contrário das outras crianças, que ficavam completamente hipnotizadas com a visão de animais tão majestosos e se divertiam com os respingos de água provocados pelos mergulhos performáticos, eu me senti mal. Muito mal.
Mesmo não sabendo explicar conscientemente o porquê, aquilo me parecia errado, sem sentido. Animais selvagens, enormes, lindos, confinados em uma piscina de água turva e tamanho obviamente insuficiente.
Mais velha, impulsionada por essa indignação de infância, passei a estudar a tristeza da vida de animais marinhos capturados da natureza para fins de entretenimento e interação com humanos.
Foi quando conheci a história de Tilikum, orca capturada da natureza em 1983, quem, alguns pesquisadores acreditam, era irmão de uma das orcas cativas que vi quando criança – quem também, infelizmente, a maioria das pessoas conhece como a baleia que matou a própria treinadora em 2010.
Eu ainda pesquisava com poucos recursos e raras informações confiáveis e acessíveis, como uma jornalista da década de 1990, sem redes sociais ou WhatsApp, e sem nem sequer imaginar que a vida de abusos e privação de liberdade de Tilikum seria disseminada pelo mundo em 2013, com o lançamento do documentário Blackfish.
Comecei a escrever artigos, ganhei o apoio de uma assessoria de imprensa – ao Guilherme Pichonelli e equipe, meu eterno muito obrigada por isso – e pude compartilhar argumentos fundamentados em todas as informações que conseguia angariar para que quem estivesse lendo aquele texto não visitasse nem consequentemente financiasse atrações com animais selvagens. Cheguei até a me reunir com ativistas envolvidos na reabilitação e liberdade do último golfinho em cativeiro no Brasil. Mas, no fundo, todos sabíamos que não conseguiríamos libertar Tilikum – tampouco, mudar o seu destino.
Isso porque, no comércio antiético de animais selvagens, as espécies são percebidas – legalmente, inclusive – como produtos. Logo, se um parque comprou uma orca, essa orca é do parque – talvez tenham até nota fiscal.
Ser ativista também é lidar com quase nunca vencer.
Tilikum morreu em 06 de janeiro de 2017. Sem a família, com a saúde mental dilacerada, fisicamente exausto – chegava a passar três horas sem se mexer dentro do tanque – e sozinho. Nesse mesmo dia, lhe fiz uma promessa: enquanto eu estiver aqui, contarei incansavelmente a sua história.
Escrevo sobre ele. Sempre lembro dele. Dediquei meu livro a ele. E este artigo é parte do cumprimento da promessa que fiz a ele.
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